Os delegados da polícia federal estão surfando como Gabriel
Medina em Teahupoo na onda da Operação Lava Jato e aproveitando para fazerem um
lobby feroz, contínuo e multimilionário para que os parlamentares aprovem a
"toque de caixa" a PEC 412. Essa proposta de emenda constitucional dá
para o diretor geral da PF a autonomia administrativa e financeira e assim, com
ela aprovada, a Constituição Federal passaria a garantir para o dirigente do
órgão verbas ilimitadas e poderes múltiplos para fazer qualquer modificação
administrativa, inclusive normatizar as diferentes funções do órgão, sem que
isso passe pela análise do Congresso Nacional.
Se qualquer brasileiro desprovido de maldades e que não estiver
envolvido direta ou indiretamente nas mais variadas formas de falcatruas que
são apuradas pela polícia federal, irá certamente ser a favor da autonomia da
polícia federal, para que ela possa, com liberdade e sem interferência de
ninguém, apurar a corrupção. Não é isso que todos nós queremos?
Essa é a propaganda dos marqueteiros políticos e lobistas
altamente profissionais que estão assessorando os delegados da polícia federal.
Isso é o que estão propagando aos quatro cantos do país, para que os
parlamentares sejam até obrigados pelo clamor público das ruas a aprovarem essa
emenda constitucional. Mas se qualquer pessoa que tiver mais interessada em ir
a fundo antes de dizer que essa proposta é para o bem e traz autonomia, temos
que fazer a seguinte pergunta: traz autonomia para quem?
Para a instituição policial federal fica fácil constatar que não
é, já que a polícia federal hoje vive uma crise de existência sem precedentes e
que já beira o confronto físico entre os agentes, escrivães e papiloscopistas
de um lado e os delegados de outro. Fazendo uma pesquisa entre todos os
servidores da PF fica muito fácil saber que apenas os delegados são favoráveis
e buscam essa tal de "autonomia" através da PEC 412 e o temor da
aprovação dessa PEC por parte das demais categorias se justifica plenamente,
quando essa autonomia será concedida, na verdade aos delegados e não para a
instituição policial. Isso não se justifica. A polícia federal já possui a
propalada autonomia para investigar qualquer tipo de corrupção, tanto que vem
fazendo isso nas dezenas de operações famosas que já fez e faz, tanto no
governo do PT com o mensalão e agora atualmente com a operação Lava a Jato. A
PF já tinha legalmente essa autonomia também no governo FHC e nos anteriores.
No governo tucano nas Operações Banestado, Caso Sivam, (antes a criatividade
para dar nomes às operações ainda não estavam afloradas na PF) e outras dezenas
de operações não menos famigeradas e se as investigações não andavam mais para
a frente nessa época não era por culpa da PF, mas sim por atuação do
"engavetador geral da república", cargo esse que me parece extinto.
Portanto, não é verdadeiro alardear para a população e os
parlamentares, que os delegados de polícia buscam autonomia para a PF poder
investigar a corrupção. Nessa manifestação do dia 12 de abril fizeram isso
através de uma campanha milionária, que contou com materiais caros dignos de
campanhas presidenciais, já que apresentaram balões infláveis, camisetas,
materiais impressos e faixas plásticas de primeira qualidade, que distribuíram
em todas as capitais do Brasil e nas grandes cidades, onde aconteceram
manifestações públicas contra a presidenta Dilma e contra a corrupção.
Concedida essa "autonomia" administrativa para o
diretor geral da PF, que é um delegado de polícia e pelas múltiplas medidas
internas que já determinou sempre em detrimentos das demais categorias
existentes, que juntas somam mais de 80% do órgão, fica muito claro que se
aprovada, essa PEC vai fazer o papel de gasolina no já incontrolável incêndio
que existe hoje e queimará com certeza absoluta, as últimas relações existentes
entre os delegados e os demais componentes que trabalham na PF, e mais, será
uma coisa só brasileira em termos de administração policial, já que esse tipo
de autonomia é concedida apenas e acertadamente para órgãos que devem ser
autônomos pelas suas atribuições exclusivas, como o judiciário, legislativo e
ministério público. Organismo policial algum possui uma autonomia dessa
natureza e envergadura, até porque não possuem atividades exclusivamente
autônomas. Nem o FBI ou a SCOTLAND YARD possuem um verdadeiro "cheque em
branco" administrativo e financeiro dessa magnitude passado pelos seus
respectivos governos.
O que existe por trás dessa busca frenética pela aprovação da
PEC 412 é a mesmíssima coisa que os delegados da polícia federal e das
estaduais tentaram conseguir recentemente com a aprovação da PEC 37. Querem
mais poder. Essa outra PEC foi totalmente rechaçada pelo Congresso Nacional e
pela população brasileira através dos violentos movimentos de rua acontecidos
na Copa das Confederações. Essa PEC 37 praticamente extirpava o poder de
investigação do MP e a prerrogativa constitucional que o Ministério Público tem
hoje para executar o controle externo das policias.Ninguém em sã consciência
quer isso e nessa ocasião os delegados de polícia também fizeram um lobby feroz
e agressivo dentro do congresso nacional, tão agressivo que alguns
parlamentares se sentiram coagidos por esse tipo de lobby pela abordagem
executada e alguns até procuraram a imprensa para denunciar isso.
Os governadores dos estados (todos eles) já perceberam o que
pretendem os delegados da PF com a essa tal "autonomia " e já estão
preocupados com a aprovação dessa PEC 412, que também acabará tendo o mesmo
reflexo jurídico administrativo nas polícias estaduais, sendo que os
governadores não querem dar esse poder total aos delegados de polícia através
de uma autonomia financeira e administrativa, que obrigaria os estados a
pagarem o salário que os delegados desejarem, já que uma autonomia financeira é
isso que traz de poder embutido. Os governadores dos estados e seus secretários
de finanças ficam imaginando os delegados podendo legalmente se auto conceder
reajustes salariais de acordo com as suas vontades, reajustes esses que
acabariam desequilibrando as finanças estaduais. Os governadores se preocupam
também que aprovada essa PEC da "autonomia" eles sejam obrigados,
pela constituição a nomearem somente delegados para a secretária de segurança
pública e isso para alguns estados seria o caos total nas policias estaduais,
já que os governadores de bom senso acabam sendo obrigados a nomear pessoas que
não são policiais, exatamente para que não haja desentendimentos entre oficiais
das policias militares e os delegados de policia estaduais, como é o caso de
São Paulo, Ceará, Distrito Federal, Rio de Janeiro e muitos outros.
Menos de quatro meses atrás, a presidenta Dilma interrompeu a
campanha eleitoral para EDITAR E ASSINAR, por força do lobby dos delegados a
MEDIDA PROVISÓRIA 657 (qual a urgência disso para justificar legalmente uma
MP?) , que foi convertida na Lei 13.047 de 2014, onde fica estipulado
legalmente que somente delegados da PF podem assumir o cargo de diretor geral,
outra coisa inusitada e só brasileira, já que até o diretor do FBI (o diretor
do FBI atualmente é um advogado), da INTERPOL (a diretora da Interpol
atualmente é formada em Artes e Ciências Policiais) e das mais importantes
policias do mundo, o presidente da república ou primeiros ministros podem
nomear pessoas capacitadas que possuem um conhecimento respeitável sobre
segurança pública, atributos profissionais esses que não se encontra
exclusivamente e nem são monopólio de delegados de polícia.
Os delegados três meses depois de conseguirem essa proeza ,
pasmem, através de uma MEDIDA PROVISÓRIA, esse privilégio passa a ser mais uma
coisa só brasileira, mesmo assim os delegados de polícia querem mais poder
ainda e em pouco tempo estarão pedindo mais e mais e futuramente um quarto
poder estará atuante e constituído. Com a aprovação dessa PEC 412 certamente
estará formada uma verdadeira "república dos Delegados".
As verdadeiras pretensões super corporativistas dos delegados
são essas e não a busca por uma autonomia investigativa, que a PF já possui, já
que nem o presidente da república e nem o ministro da justiça possuem poderes
constitucionais ou outras normas menores para interferirem em investigações da
PF e se algum presidente de inquérito comunica algo sobre investigações
sigilosas para seus superiores administrativos, o faz por motivos políticos
pessoais ou até para se perpetuarem no cargo, mas que fique bem claro, que ele
não é obrigado legalmente a fazer isso. O presidente de uma investigação
policial só deve prestar contas dos seus atos ao judiciário e ao ministério
público. Por isso também, em desfavor desses órgãos verdadeiramente autônomos
os delegados de polícia não podem ter a autonomia que buscam com a PEC 412, sob
pena de desequilibrarem até o processo penal existente hoje.
Assim encerramos perguntando para todos : Essa PEC 412
verdadeiramente não busca autonomia para o Departamento de Polícia Federal e,
se não busca autonomia para a PF, busca "autonomia" para quem, cara
pálida?
FRANCISCO CARLOS GARISTO
Francisco Carlos Garisto (@FCGaristo) é advogado, jornalista, policial federal e consultor em Segurança Pública. Foi presidente da Fenapef
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